Novos tempos, novas oportunidades? Pelo menos no caso de plantas utilizadas como pastagens tropicais cultivadas no Brasil, parece que sim. No início dos anos 70 nos libertamos de um longo período de poucas opções de plantas para esse tipo de uso, até então limitadas aos capins-jaraguá (Hyparrenia rufa), colonião (Megathyrsus maximus var. maximus), gordura (Melinis minutiflora) e pará (Urochloa mutica). O fim dessa era foi decretado pela importação comercial de grande número de cultivares australianos.
Uma nova era teve seu começo no início dos anos 80 com a liberação pela EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) da U. brizantha cv. Marandu, popularmente conhecida como braquiarão, brizantão, marandu. Desde então cerca de 45 cultivares, pertencentes a 13 espécies e híbridos foram criadas. Pelo menos 20 dessas cultivares ocupam uma fração significativa do mercado atual de sementes no Brasil.
Tamanho número de opções pode ter estimulando testes destas cultivares para de situações não tradicionais de uso (leia-se, pastagem) e, de fato, alternativas têm sido identificadas. Atualmente, as principais delas são:
– cobertura vegetal entrelinhas de diversas culturas perenes: o cultivo de determinadas gramíneas (exemplos: U. decumbens, U. ruziziensis) ou de leguminosas (exemplo: Arachis pintoi) entre linhas de culturas arborícolas como pomares, cafezais, coqueirais, seringais, além de vinhedos, dentre outras culturas perenes, pode beneficiar essas culturas face seus efeitos de proteção contra erosões, de promoção da ciclagem de nutrientes, de interrupção do ciclo de pragas e de doenças, de enriquecimento com matéria orgânica e de melhoramento das características físicas e químicas do solo, além de outros. Cabe lembrar que algumas das espécies/cultivares de gramíneas e de leguminosas perenes tropicais toleram até níveis moderados de sombra, o que contribui às suas adaptações a esse tipo de cultivo;
– produção de palhada em sistemas de plantio direto: o plantio direto na palha, de culturas agrícolas como soja, milho, sorgo e milheto, encontra-se consagrado em diversas regiões brasileiras. Além dos efeitos benéficos idênticos aos descritos no caso de plantio entrelinhas (acima), nesse sistema de plantio a palhada reduz a velocidade de perda de água do solo por evapotranspiração. Dentre as gramíneas perenes usadas para produzir a palha, presentemente a U. ruziziensis tem merecido a preferência dos produtores. No entanto, cultivares de várias outras espécies podem também ser usadas desde que atendam requisitos específicos quanto ao porte das plantas, à produção de matéria seca, ao hábito de crescimento, à facilidade de dessecação química, ao grau de resistência a espécies de nematóides, à rapidez de estabelecimento, à ausência de efeitos alelopáticos e à disponibilidade de sementes.
Esses dois casos constituem os usos alternativos mais frequentes de cultivares originalmente propostas para uso como pastagens cultivadas. Porém, há outros nichos mercadológicos potenciais de uso pelos quais têm-se verificado algum interesse em tempos recentes; são exemplos: cobertura vegetal de taludes, de margens de rodovias, de ferrovias, de pistas de aterrissagem/decolagem em aeroportos e de tanques escavados para piscicultura, produção de bioenergia, de compostos orgânicos, de químicos-plataforma, de biomantas e de papel, embalagens de frutas, descontaminação e descompactação de solos e alimentação de suínos e de aves.
Para cada uso, a cultivar deve apresentar um conjunto específico de atributos, ou seja, um ‘ideótipo’, que deve ser buscado para cada caso. Assim, por exemplo, no ideótipo de planta para cobertura de margens de rodovia, baixo requisito de podas e baixa altura de crescimento são características de alta importância. Estas, no entanto, são características indesejáveis para o ideótipo de cultivar destinada à produção de energia a partir da sua biomassa.
Por certo, quanto maior a disponibilidade cultivares, maior é a probabilidade de encontrar uma que mais se aproxima do ideótipo pretendido, quer dizer, aquela cujo cultivo oferece maior probabilidade de alcance dos objetivos desejados. Isso talvez explique o crescente interesse por usos alternativos para as cultivares originalmente desenvolvidas para utilização como ‘plantas forrageiras’ no Brasil. O impacto desse interesse sobre o mercado brasileiro de sementes é uma das suas consequências prováveis.
Interessado sobre esse assunto? Então leia mais sobre ele em:
LÉDO, F.J.S.; MACHADO, J.C. Construindo um ideótipo de gramínea para produção de energia. In: Souza, F.H.D.; Matta, F.P.; Fávero, A.P. (Eds.) Construção de ideótipos de gramíneas para usos diversos. São Carlos: Embrapa Pecuária Sudeste. Capítulo 11, p.227-235, 2013.
MACHADO, L.A.Z.; CECCON, G.; ADEGAS, F.S. Integração lavoura-pecuária floresta. 2. Identificação e implantação de forrageiras na integração lavoura-pecuária. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, Documentos, 111. 57p. 2011.
SOUZA, F.H.D., POTT, E.B., PRIMAVESI, O., BERNARDI, A.C.C.B., RODRIGUES, A.A. (Eds.).
Usos alternativos da palhada residual da produção de sementes para pastagens. São Carlos: EMBRAPA Pecuária Sudeste. 241p..2006.
SOUZA, F.H.D.; GUSMÃO, M.R.; MATTA, F.P.; CASTRO, A.C.R.; MITTELMANN, A.; FÁVERO, A.P.; JANK, L. Atributos desejáveis para gramados a serem cultivados sob condições brasileiras: uma proposta. Ornamental Horticulture, v.22, n.2, p.154-165, 2016.
Este texto pode ser citado da seguinte forma:
SOUZA, F.H.D. Alternativas de uso para plantas forrageiras tropicais. Disponível em: https://progreseed.com.br/alternativas-de-uso-para-plantas-forrageiras-tropicais/ Acessado em: Dia/Mês/Ano.